A compra de imóveis em leilões judiciais envolve um estudo minucioso do processo judicial. Por isso, não pode ser realizado sem a assessoria técnica de um profissional que entenda os detalhes que permeiam o imóvel que está sendo levado à hasta pública.
O primeiro passo a ser analisado antes da arrematação são as dívidas tributárias e condominiais do bem a ser leiloado. Não obstante existirem jurisprudências que afastam estas dívidas em leilão judicial, tal entendimento envolve nuances, conforme vem entendendo o Superior Tribunal de Justiça – STJ.
Vejamos acórdão que demonstra detalhes envolvendo a sub-rogação sobre o preço da arrematação que foi anulado pelo STJ. Observe-se que o mérito da questão está centrado no fato de que o edital do leilão previa o pagamento pelo arrematante dos tributos do imóvel, apesar de haver expressa previsão no artigo 130 do Código Tributário Nacional de que o comprador não pagará tributos, mas tão somente o preço previsto no edital.
Vejamos o que diz o artigo 130 do Código Tributário Nacional:
Art. 130. Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, subrogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação.
Parágrafo único. No caso de arrematação em hasta pública, a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço.
Analisemos a decisão do STJ:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CRÉDITO TRIBUTÁRIO. IPTU. ARREMATAÇÃO DE IMÓVEL EM HASTA PÚBLICA. SUB-ROGAÇÃO SOBRE O PREÇO DO BEM. AFASTAMENTO DA REGRA DO ART. 130, PARÁGRAFO ÚNICO DO CTN. EDITAL CONSIGNANDO A EXISTÊNCIA DE DÉBITOS FISCAIS E ATRIBUINDO AO ARREMATANTE A RESPONSABILIDADE PELA QUITAÇÃO DOS MESMOS. QUESTÃO INVOCADA E NÃO ENFRENTADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. FUNDAMENTAÇÃO DECISÓRIA DEFICIENTE CONSTATADA. VIOLAÇÃO DO ART. 489, § 1º, DO CPC/2015 CONFIGURADA. I - Na origem, cuida-se de mandado de segurança julgado procedente, em primeira e segunda instância para: declarar inexigíveis ao arrematante os créditos oriundos do inadimplemento do IPTU incidente sobre a propriedade do bem imóvel antes da arrematação do mesmo em hasta pública; e determinar que a autoridade impretrada forneça ao impetrante a certidão negativa de débitos tributários, relativa ao período anterior à data da arrematação do imóvel. II - A parte recorrente sustenta, em síntese, que o acórdão recorrido careceu de adequada fundamentação, porquanto não foram enfrentados os argumentos por ela oportunamente suscitados quando da interposição tanto da apelação quanto dos embargos de declaração. III - Em que pese a interposição de embargos declaratórios contra o acórdão proferido, o Tribunal de origem não enfrentou o argumento invocado pela parte ora recorrente, relativo à expressa menção, no edital de hasta pública, da existência de débitos fiscais de IPTU vinculados ao imóvel levado à praça, pelos quais ficaria responsável o eventual arrematante do bem. IV - A ausência de apreciação da questão invocada apta, ao menos em tese, a infirmar a conclusão obtida pela Corte Julgadora originária denotou a deficiência da fundamentação decisória do acórdão proferido e, consequentemente, caracterizou a violação do art. 489, § 1º, do CPC/2015. Precedente: REsp n. 1.685.549/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 19/9/2017, DJe 10/10/2017. V - Impositiva a anulação do acórdão impugnado, com o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que o argumento relevante invocado, carente de apreciação, seja devidamente enfrentado. VI - Recurso especial parcialmente provido. T2 - SEGUNDA TURMA REsp 1810282 / SP Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO 2019/0111389-5 DJe 14/06/2019
Logo, o arrematante tem que se atentar a detalhes mínimos que muitas vezes passam despercebidos pelo olho destreinado, especialmente em relação a dívidas tributárias. Dívidas condominiais também devem ser observadas pelo arrematante, já que fazem parte da coisa, ou seja, do bem imóvel a ser arrematado.
Outro detalhe que não pode ser desconsiderado são as averbações de penhoras que constam no registro do imóvel e que muitas vezes inviabilizam o registro em cartório. Indisponibilidades determinadas pelo Juízo criminal ou ações de improbidade administrativa em face do devedor também devem ser analisadas e consideradas.
Como se observa, a arrematação envolve conhecimento técnico de um profissional experiente. Por outro lado, por ser um ato complexo, torna-se atrativa para investidores. Tais negociantes podem obter ganhos caso estejam dispostos a travar uma batalha jurídica com os executados. Com efeito, é no embate da hasta pública que se obtém os melhores ganhos, pois grandes valores estão sujeitos a grandes tributos os quais podem ser desconsiderados pelo Juízo em virtude da permissão dada pelo artigo 130 do CTN. No entanto, algumas discussões em leilões judiciais podem levar anos, fato que deve ser considerado pelo investidor.
Assim, investidores podem obter lucros acima de 40% em 2 ou 3 anos caso estejam dispostos a discutir questões controvertidas em hasta pública. Porém, caso o investidor não queira discutir a execução basta formular pedido de desitência após o primeiro incidente processual instaurado posteriormente à compra ou à notícia de irregularidade na intimação de credores pignoratícios, hipotecários ou anticréticos, ou ainda, equívocos no edital, quando lhe será devolvido o valor pago.
Vejamos o texto trazido pelo novo Código de Processo Civil de 2015 sobre a desistência:
Art. 903. Qualquer que seja a modalidade de leilão, assinado o auto pelo juiz, pelo arrematante e pelo leiloeiro, a arrematação será considerada perfeita, acabada e irretratável, ainda que venham a ser julgados procedentes os embargos do executado ou a ação autônoma de que trata o § 4º deste artigo, assegurada a possibilidade de reparação pelos prejuízos sofridos.
§ 1º Ressalvadas outras situações previstas neste Código, a arrematação poderá, no entanto, ser:
I – invalidada, quando realizada por preço vil ou com outro vício;
II – considerada ineficaz, se não observado o disposto no art. 804;
III – resolvida, se não for pago o preço ou se não for prestada a caução.
§ 2º O juiz decidirá acerca das situações referidas no § 1º, se for provocado em até 10 (dez) dias após o aperfeiçoamento da arrematação.
§ 3º Passado o prazo previsto no § 2º sem que tenha havido alegação de qualquer das situações previstas no § 1º, será expedida a carta de arrematação e, conforme o caso, a ordem de entrega ou mandado de imissão na posse.
§ 4º Após a expedição da carta de arrematação ou da ordem de entrega, a invalidação da arrematação poderá ser pleiteada por ação autônoma, em cujo processo o arrematante figurará como litisconsorte necessário.
§ 5º O arrematante poderá desistir da arrematação, sendo-lhe imediatamente devolvido o depósito que tiver feito:
I – se provar, nos 10 (dez) dias seguintes, a existência de ônus real ou gravame não mencionado no edital;
II – se, antes de expedida a carta de arrematação ou a ordem de entrega, o executado alegar alguma das situações previstas no § 1º ;
III – uma vez citado para responder a ação autônoma de que trata o § 4º deste artigo, desde que apresente a desistência no prazo de que dispõe para responder a essa ação.
§ 6º Considera-se ato atentatório à dignidade da justiça a suscitação infundada de vício com o objetivo de ensejar a desistência do arrematante, devendo o suscitante ser condenado, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos, ao pagamento de multa, a ser fixada pelo juiz e devida ao exequente, em montante não superior a vinte por cento do valor atualizado do bem.”
Portanto, a arrematação de bens imóveis em hasta pública tem o condão de gerar bons lucros a grandes investidores dispostos a lutar contra devedores que resistem à venda de seus bens.
Noutro contexto, pequenos investidores também podem se beneficiar dos leilões judiciais adquirindo bens descomplicados e com pequenos embaraços tributários. Esses compradores podem desistir a qualquer momento da compra caso não estejam dispostos a enfrentar uma discussão executória em hasta pública.
Resumidamente, leilões judiciais são atos complexos e que demandam assessoria técnica podendo gerar ótimos dividendos para pessoas acostumadas a fazer negócios imobiliários. Enfim, trata-se de um investimento de médio risco, sujeito a diversos acontecimentos jurídicos, não sendo recomendado para leigos e pessoas não acostumadas ao mercado de investimentos imobiliários.